FORMAÇÃO POLÍTICA

Congresso X Supremo

Altos escalões colaboram com radicalismo político no país.

Quando Fernando Collor de Mello caiu, seu vice Itamar Franco assumiu o comando do país e nos brindou com o “Plano Real”. Quando Dilma Rousseff foi defenestrada do cargo, Michel Temer conseguiu, em pouco tempo, acalmar o país e promover o controle sobre os gastos públicos, além de modernizar a Lei Trabalhista. Foram governos “de centro”.

Lula (PT), que sempre gostou de caminhar no terreno do embate, encontrou seu oposto ideal em Jair Bolsonaro (PL). Ambos se retroalimentam e levam consigo uma legião de fãs, que não conseguem ver a política como o caminho do consenso, tratando-a como se fosse um jogo de futebol onde, para um ganhar, o outro tem necessariamente de perder.

Nosso Congresso atual é conservador, de direita. Lula, de esquerda. O Supremo Tribunal Federal é composto por onze Ministros cujas posições têm ficado cada vez mais claras — entraram no jogo político. Acontece que a função dos ministros do Supremo é a de verificar a constitucionalidade das leis e dos atos, não a de direcionar a sociedade. Então temos um grave problema.

A discussão sobre o porte de maconha é um exemplo disto. Como o Congresso se demora em decidir, afinal o que pode e o que não pode, o Supremo decidiu (porque provocado) que o porte de maconha até determinada quantidade (40 g) não será mais punido como atualmente o é, isto é, com medidas educativas e de prestação de serviços comunitários.

Diante disto, o Congresso se insurge e promete acelerar uma PEC que criminaliza o que o Supremo acaba de descriminalizar e que atualmente é criminalizado. Nossos mais altos escalões de poder estão literalmente batendo cabeça com questões que deveriam ser decididas no âmbito de um parlamento que realmente funcionasse.

No mesmo impasse encontram-se outras problemáticas que só quem as vivenciam na pele sabem da urgência que demandam. O marco temporal da demarcação das terras indígenas e a questão do aborto legal são exemplos. Sem falar no desserviço que tem sido feito pelo Supremo no que diz respeito às decisões referentes à Lava Jato.

Estamos atingindo a marca dos quarenta anos de democracia. Nas outras ocasiões que nosso sistema ruiu, foi porque a sociedade brasileira não conseguiu se entender —  e isto começa por nossas instituições. 

É preciso repactuar nossa República para que a paz social de que tanto necessitamos para desenvolvermos, seja estabelecida. E isto começa com estes senhores de toga e ternos alinhados. É hora de pensar no país.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Quem vai preso?

Folha de S. Paulo, 27.jun.2024

* * *

Sentado na poltrona, como todas as manhãs, João Ítalo prepara-se para o seu ritual de sarcasmo matinal. “Supremo fixa em 40 g de maconha o limite para diferenciar uso de tráfico

Lembra dos tempos em que, na juventude, fumava maconha com os amigos em alguma esquina escura da Mooca.

Olha para a filha Emília, de 17 anos e se pergunta como ela faz para fumar maconha hoje em dia. Certamente é algo bem mais tranquilo do que antigamente.

Antigamente, a gente tinha medo de fazer isto”, pensa com seus botões. Folheando o jornal, concorda com a roteirista Flávia Boggio, que diz que “para integrantes das classes média e alta brasileira, maconha já era legalizada”. Tem razão!

Quem vai preso por isso hoje no Brasil? Ah, pretos e pobres vão…

Em silêncio, João se levanta e direciona-se para a mesa de café com uma pergunta a ferventar-lhe os miolos. “Se o consumo é proibido, como o porte pode ser liberado?”.

FORMAÇÃO POLÍTICA, Introdução à Política

As elites contra uma Nação — A desigualdade como projeto

Pouco antes da transformação do Brasil em República um conjunto de leis foi editado com o objetivo de manter as desigualdades sociais presentes desde nossa fundação, visando a posteridade.

Estavam ali colocadas e pensadas as normas que iriam tornar a desigualdade de nascimento uma das marcas que nos acompanham história, uma covardia atroz.

A década de 1850 é o momento em que finalmente o tráfico de negros escravos para o Brasil foi suspenso. Com isso e para suprir a necessidade de mão de obra especialmente para a lavoura, foi pensado na possibilidade de se estimular a imigração de estrangeiros europeus para o país.

Na Europa, a coisa não andava boa. Milhões de italianos, espanhóis, portugueses, alemães migravam para o novo Mundo em busca de oportunidades. Neste contexto, o Brasil passou a ser uma opção para esse pessoal, que já chegava por aqui em condições melhores do que a dos escravos que em breve seriam postos para correr das fazendas, tão logo a escravidão fosse extinta —  o que se deu em 1888.

Abolida a escravidão no Brasil, os ex-escravos foram dispensados das fazendas em que viviam.

Os fazendeiros queriam se desvencilhar da carga que os ex-escravos poderiam se tornar e, ao mesmo tempo, receber uma indenização do governo para promover a soltura dos cativos. No final das contas, o governo imperial negou indenizar e, quando finalmente promoveu a abolição, o império caiu, e os negros ex-escravos não se tornaram o peso que eles rejeitaram.

Mas, para se bem compreender a desigualdade social brasileira é necessário focar na “Lei de Terras”, e não na “Eusébio de Queirós”.

Esta Lei, também de 1850, tinha como objetivo regularizar a propriedade da terra, especialmente nas regiões rurais. Na superfície ela estabelecia normas, como a obrigatoriedade do registro das terras e a concessão de títulos de propriedade. O seu espírito era outro.

Ao criar o conceito de “terras devolutas”, que se referia às terras consideradas não ocupadas, podendo as mesmas serem compradas ou concedidas pelo Estado, daria aos já enriquecidos o meio de se apossarem de mais terras, possibilitando a institucionalização do latifúndio no Brasil.

Esta norma veio, na realidade, concretizar a concentração de terras nas mãos de poucos proprietários, contribuindo e legitimando a desigualdade fundiária no país.

Muitos camponeses e comunidades foram afetados, já que não possuíam meios para comprovar a posse de suas terras e acabaram ou expulsos ou perdendo o acesso a recursos naturais. Essa lei estabelecia que somente poderia ser proprietário de terras no Brasil aqueles que herdaram títulos legais, ou seja, pessoas físicas ou jurídicas brasileiras.

Estabeleceu, assim, um mercado formal de terras, beneficiando grandes proprietários que já possuíam vastas extensões de terra, ou que delas tomaram posse ao terem mais facilidade em ‘apresentar títulos’ que comprovavam a propriedade.

E, embora a Lei de Terras tenha beneficiado principalmente os grandes proprietários rurais e contribuído para a formação de um mercado de terras formal, ela não foi diretamente benéfica para a maioria dos imigrantes europeus que chegaram ao Brasil no final do século XIX, ao menos num primeiro momento.

No entanto, políticas de colonização e iniciativas locais em algumas regiões do país proporcionaram certas oportunidades de acesso à terra para esses imigrantes, ainda que de forma limitada e desigual. Mas, nenhuma colônia de alocação de negros foi incentivada pelo governo.

O governo brasileiro incentivou a vinda de imigrantes europeus, oferecendo-lhes, enfim, a possibilidade de adquirir terras para cultivar.

Essa política tinha como objetivo suprir a demanda por mão de obra nas lavouras, substituindo o trabalho escravo que estava em declínio na época. Além disso, o governo buscava promover o povoamento e o desenvolvimento econômico do país por meio da colonização agrícola.

Os imigrantes europeus trouxeram suas culturas, conhecimentos agrícolas e emoções para a diversidade étnica e cultural do Brasil. Eles se estabeleceram principalmente nas regiões Sul e Sudeste do país, dedicando-se à agricultura, à pecuária e outras atividades rurais, mas muitos também se fixaram na cidade, fazendo evoluir metrópoles como São Paulo, por exemplo.

Apesar da Lei de Terras de 1850 ter inicialmente dificultado o acesso à terra para imigrantes europeus, políticas governamentais de incentivo à imigração e colonização no final do século XIX e início do século XX acabaram por facilitar esse acesso.

Assim, os imigrantes europeus começaram a poder comprar terras no Brasil de forma mais significativa a partir da última década do século XIX, com um aumento substancial nas décadas seguintes devido às políticas de colonização dirigidas e incentivos governamentais.

Aos poucos, os imigrantes foram adquirido as terras em que laboravam, criando colônias que se transformaram em cidades. Esta é a origem de muitas cidades, em especial no Rio Grande do Sul.

A Lei de Terras e a vinda dos imigrantes tiveram impactos influenciados na formação social e econômica do Brasil. Contribuíram para o desenvolvimento da agricultura, a diversificação das atividades vividas e a transformação das paisagens rurais. Além disso, influenciaram a composição étnica da população brasileira, tornando o país multicultural e plural.

O Morro da Providência, no Rio, é tido como a primeira favela brasileira.

Mas, por outro lado, acabou por negar aos negros qualquer possibilidade de se estabelecerem socialmente. Foram relegados ao esquecimento. Abandonados à própria sorte, sem trabalho, sem instrução e, sem qualquer assistência, passaram a ocupar os piores lugares da esfera social. Para eles, criou-se as favelas.

A Diáspora Europeia

No final do século XIX, a Europa estava imersa em profundas transformações. A Revolução Industrial, aliada a crises econômicas, perseguições políticas e religiosas, impulsionou uma massiva diáspora de europeus mundo afora. Entre as terras que se ofereciam a recebê-los, o Brasil, então sob o reinado de Dom Pedro II, surgiu como destino promissor. E, mesmo após a queda do sistema, o Brasil continuou a ser um destino atrativo.

Os europeus, aos milhões, migravam para a América. Brasil, Argentina e Estados Unidos se configuraram os principais destinos de uma gente que buscava novas oportunidades de vida.

A chegada dos imigrantes europeus ao Brasil foi marcada por expectativas e desafios. Muitos buscavam escapar da pobreza e da opressão, atraídos pelas promessas de terra e liberdade. O governo brasileiro, por sua vez, via na imigração uma oportunidade para “branquear” a população e desenvolver a economia agrária, especialmente após a abolição da escravidão.

Os imigrantes tiveram um impacto profundo na sociedade brasileira. Eles trouxeram consigo habilidades, tradições culturais e uma ética de trabalho que contribuíram significativamente para o desenvolvimento econômico do país. As colônias europeias, estabelecidas em várias regiões, tornaram-se centros de progresso agrícola e industrial.

Contudo, a influência desses imigrantes não se limitou à economia. Eles também desempenharam um papel crucial na transformação do cenário político brasileiro. A presença de ideias liberais e republicanas, comuns entre muitos imigrantes, alimentou o descontentamento com a monarquia.

Essa conjuntura contribuiu para o enfraquecimento do regime monárquico e fortaleceu os ideais republicanos que culminaram na Proclamação da República em 1889.

O governo brasileiro, ao fazer a opção pelo imigrante europeu nada mais fazia do seguir uma tendência ideológica que entendia que o europeu era o povo mais civilizado do mundo e que os demais povos deveriam se mirar na cultura deles para se desenvolverem e assim atingir um estágio evoluído.

Milhões de imigrantes europeus desembarcaram no Brasil entre o final do séc. XIX e início do XX.

Foi neste contexto que o Brasil fez a opção para chamar o europeu e deixar o africano que para cá havia sido trazido à força, de lado. Como o silvícola nacional, também o negro africano foi deixado às margens do caminho.

Assim, podemos entender que as guerras e os problemas que assolavam um continente que se dizia e entendia “superior” formam um dos sustentáculos que fundou a república brasileira, erigida para o apanágio de uma classe dominante, que se entendia europeizada e que desprezava as demais, negando-lhes oportunidades e dificultando-lhes a existência.

Consequência: A violência urbana

No Brasil, a violência urbana foi gestada durante trezentos anos de escravidão e, depois, forjada no abandono completo a que a gente preta deste país foi relegada.

Quando os negros foram libertos, não foram  acolhidos por algum programa de inclusão social.  O governo — de início imperial mas na sequencia, republicano — preferiu trazer mão de obra europeia para suprir as necessidades de mão-de-obra no país.

Isto é, quando o trabalho passa a ser assalariado, os negros serão colocados de lado e substituídos por uma gente que por aqui chegava atrás das ricas terras para a agricultura.

Empurrados para as favelas que logo surgiriam, órfãos de Estado, sem educação regular, sem emprego, enquanto os filhos dos europeus foram se constituindo em uma classe média, letrada e com bons empregos, os negros e seus descendentes mestiços foram sendo deixados à deriva social.

A letra da canção “Muros e Grades”, da banda Engenheiros do Hawaii retrata nossa situação, fruto de uma sociedade que insiste em não dividir.

Banda gaúcha ironiza a maneira com o qual a elite se protege da violência urbana.

“Nas grandes cidades, do pequeno dia a dia

O medo nos leva a tudo, sobretudo à fantasia

Então erguemos muros que nos dão a garantia

De que morreremos cheios de uma vida tão vazia.”

Precisamos nos repensar como Nação! Diz-se que, no Brasil, ninguém quer se ver pobre. O pobre se vê como classe média, o classe média como rico e o rico nem se vê como brasileiro. Isso se dá porque ninguém assume sua parcela de responsabilidade pela nossa desigualdade social. A culpa sempre é “do outro”. O outro são aqueles que não têm outra alternativa senão a de sobreviver.

Estes são os miseráveis — que injustamente levam a culpa pelo nosso fracasso como sociedade.

O cientista político Jessé Souza, em sua obra “A Elite do Atraso” (que tem resenha aqui no site) chama a esta classe de “ralé”.

Foi a Lei de Terras, de 1850 que deu a oportunidade para a classe dos mandantes se manter eternamente isolada das classes desfavorecidas.

Ainda não conseguimos vencer o problema da desigualdade social extrema em nosso país.

O Brasil constituiu-se em uma sociedade em que o verdadeiro preconceito é o social. Dado a grande mestiçagem que por aqui se operou, formou-se um povo diverso no qual a má distribuição de renda foi o motor de um cisão.

Então se incutiu um grande engodo no cidadão, alimentado pela nossa elite intelectual, inclusive pelas artes, nomeadamente pelo nosso cinema.

Então, se um branco é pobre, será discriminado. Se um negro é rico, será visto como de “alma branca”. Nosso problema é social e não necessariamente racial. Daí se falar em uma “democracia racial” que, na prática, não existe. O conceito de “democracia racial” é uma falácia. Não temos sequer uma “democracia social”.

Nossa elite ainda não se convenceu de que para se ter uma sociedade onde a paz social seja reinante, faz necessário dividir. Não só a terra, mas também o pão e as oportunidades.

Preferem dividir a sociedade em guetos — os ricos, nos condomínios fechados e andando em carros blindados, gastando fortunas em segurança privada, e os pobre, presos às favelas e a um futuro onde o que não existe é expectativa de melhora.

Sim, precisamos repensar este país.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Nosso velho Parlamento

2024 pode ser “ano perdido” no Congresso.

Passou o primeiro semestre e a Reforma Tributária permanece sem ser regulamentada. No segundo semestre terão lugar as eleições municipais. É provável que 2024 passe sem que o assunto evolua – isso porque, passada as eleições municipais, acontecerá a troca de comando nas Casas do parlamento, que se dará em feveriro de 2025.

A Câmara dos Deputados, liderada por Arthur Lira (PP) acabou contaminada pelo jogo que ele ali implementou com maestria. E conforme o fim do mandato de Lira se aproxima, os velhos problemas que ele tem reaparecem – e sua aura de democrata vai ficando mais opaca. 

Os frutos de sua gestão aí estão. Conduzindo com mão autoritária e apoiado por deputados que foram manejados por pura conveniência política, quase nada aconteceu.

Agora, perde-se energia e capital político discutindo questões ideológicas que beiram o medievalismo. A rua, porém, se manifestou e demonstrou àqueles senhores e senhoras que o povo ainda existe. Assim, o poderoso Lira encolheu-se e lembrou de que existem as Comissões para debater temas que, apesar de ridículos, por vezes ali aportam. 

Os protestos havidos contra a lei que pretende transformar meninas (na maioria das vezes abusadas) em criminosas, frearam o descalabro. É que, quando a Paulista grita, Brasília se recolhe.

A Câmara dos Deputados existe para debater as grandes questões nacionais. Falar de aborto, neste momento, não parece nada adequado. Andamos em círculos porque nos falta uma alma estadista em nossos altos escalões de governo. O que temos é uma inteligência que se volta para conduzir a sociedade não para frente, mas para o lado, quando não para trás.

A covardia é a marca histórica de nosso parlamento. Foram necessários quase quarenta anos após a Lei Eusébio de Queirós ser aprovada para que a  efetiva (e, ainda assim, mal planejada) abolição da escravatura tornasse realidade. 

Agora, a história se repete. Assim como os ingleses nos pressionaram a interromper com o tráfico de escravos no início do século XIX, duzentos anos depois somos pressionados a editar leis que protejam o meio ambiente. E, mais uma vez, insistimos em “leis para inglês ver” e, quando as leis existem, relaxamos na fiscalização.  Não percebem nossos governantes que estamos perdendo grandes oportunidades?

Nosso país precisa de um parlamento que dê respostas adequadas às necessidades da sociedade. O problema é que esta deficiência é difícil de ser suprida. 

E nada de colocar a culpa no povo que, supostamente, não sabe votar. O problema é que os partidos políticos (que oferecem o menu de opções), deveriam se esmerar melhor na escolha de candidatos. A julgar por quem preside os mesmos, estamos em maus lençóis.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Causa e efeito

Ex-senador por Roraima mostrou o caminho para a derrocada da operação.

Um Ministro de Estado denunciado pelo pela Polícia Federal sob suspeita de corrupção. Ele nega, e diz que há “vazamentos seletivos, sem considerar os fatos objetivos”.

Uma licitação para aquisição de mantimento para uma população que sofreu um cataclisma climático. Segundo o presidente da Conab “um novo procedimento ‘mais ajustado’ será realizado”.

Estes são apenas os exemplos da semana de como, quando não há uma estrutura legal para dar resposta aos desvios de conduta dos mandatários do poder público, o que se vê é a escancarada desfaçatez.

O ministro das Comunicações Juscelino Filho (União) já vem sendo citado como responsável por diversos crimes há tempos. Lula (PT), por cálculo político, tem fingido que nada vê.

A licitação, agora cancelada, da compra de arroz para o Rio Grande do Sul espelha claramente que o governo de Lula da Silva quer trilhar sobre os mesmos trilhos erráticos do passado. Uma vergonha. 

Quem viveu os momentos de glória da Operação Lava Jato não pode acreditar no que ela se transformou, muito disso, serviço do próprio STF, que sistematicamente vem derrubando toda a sua efetividade.

Transformar os agentes em réus e livrar os infratores de então é de uma sandice tão grande que só pode ser explicada pela inteligente jogada que os políticos fizeram ao criar a rivalidade entre os nacionais. Nesse sentido, o cansativo confronto esquerda/direita é o suprassumo desta estratégia bandida.

Estes casos irão frequentar as reportagens e os artigos de opinião dos jornais por algum tempo, até que outros os sobreponham. Assim, uma sujeira vai encobrindo a outra.

O trabalho desenvolvido durante a Lava Jato foi todo desfeito, temos de admitir. Mas a hora não é de lamentar, seria a de se o tentar resgatar. 

O problema é que o povo prefere brigar por duas personalidades que tanto mal fazem ao país (nomeadamente: Luís Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro). Assim, se esquece de que, se há uma solução, ela não está no Planalto, nem neste Congresso irresponsável, tampouco nos pináculos de um Judiciário perdulário e que cada vez deixa mais claro as suas inclinações políticas. 

A solução está nas Instituições Republicanas, tão combalidas por quem tem outros interesses, que não são necessariamente aqueles que fazem bem à sociedade, mas que servem a particulares. Aí está o verdadeiro e profundo Brasil, que políticos da estirpe de Romero Jucá (MDB) tão bem conhecem. Sim, a ordem é acabar com tudo o que pretenda fazer frente à corrupção de Estado.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Taxa das blusinhas

Site chinês inundou o Brasil de produtos baratos.

Se a Câmara dos Deputados confirmar e o presidente sancionar, finalmente o país vai cobrar o Imposto de Importação sobre as compras realizadas por pessoas físicas, cujo valor seja menor do que 50 dólares. Nem precisa questionar o porquê da demora. O governo não queria sofrer críticas da população que se refestelou com a aquisição de produtos pouco tributados e preferiu tapar os olhos. 

O curioso é que o povo brasileiro, ao comprar produtos lá de fora, penaliza empregos e renda internamente. A população deveria exigir que o comércio interno fosse menos tributado ao invés de achar barato o produto que vem da China —  aí sim a economia giraria melhor. 

Já de Lula não se pode esperar algo diferente: interessado tão-somente em aumentar sua popularidade, é o populismo que lhe move as decisões, . É por isso que, para ele, o equilíbrio fiscal tem pouco valor. A ele não faz diferença se a cobrança do imposto ajudará nas contas que ele deve nos prestar.

O governo brasileiro — aqui incluído o Legislativo — , estava demorando a tratar do assunto. O comércio local, que gera empregos anda prejudicado, enfrentando uma concorrência que tem vantagens não concedidas às empresas locais —  a isenção de impostos! 

Sabendo que o Brasil é um país que é um dos mais difíceis e fechados do mundo para se fazer negócio, é de se admirar a demora.

Por outro lado, o socorro veio através de um jabuti, isto é, foi introduzido em outra lei que não tem ligação com o assunto. A matéria foi incluída em projeto que versa sobre um programa de descarbonização do setor automotivo —  o Mover.

Verdade é que esta vergonhosa prática precisa ser abolida. Parlamentares se aproveitam de projetos que já estão com a tramitação avançada para ‘pegar uma carona‘ —  e assim, reina o improviso.

Lula, que há pouco tempo tratou do assunto com ironia atroz, não deve vetar o projeto para não se complicar diante de um parlamento que já se mostrou refratário a suas posições. 

Por esta e por outras, se estuda tanto o Brasil. 

FORMAÇÃO POLÍTICA, Introdução à Política

As elites contra uma Nação — Uma corte improvisada

Imagine uma corte que subitamente é transposta de um continente para o outro. Um rei e senhor de um império ultramarino tem de sair do conforto de seus palácios e se aventurar mar afora, rumo a uma terra inóspita. Fugia de algo pior. Da rendição, da prisão ou até da morte.

Escambo entre índios e portugueses – trocas desfavoráveis aos nativos.

Enquanto Napoleão Bonaparte direcionava seu exército para Portugal, D. João VI, ainda infante fugia com sua mãe rainha para o Brasil. Dizem que essa ideia já frequentava a mente dos pensadores da corte. Se isso é verdade, a ideia tornou-se realidade pelas necessidades do momento.

Agora imagine o povo da colônia Brasil recebendo uma autoridade de tamanha envergadura. E recebendo-a não como mera visita. Um rei que vinha para ficar!

A maneira como a Corte portuguesa se comportou ao chegar ao Brasil acabou por influenciar negativamente a formação da alma do que viria a ser, poucos anos depois, o país independente do Brasil.

O olhar dos portugueses para o populacho que aqui vivia era do total desprezo. O olhar do povo que aqui havia era de total deslumbramento. Daí até hoje o brasileiro enxergar em tudo o que é importado algo que vale mais do que o que é produzido por aqui?

A incipiente classe média que por aqui estava sendo constituída abriu as portas de suas residências para as autoridades mais importantes. Sabe-se, por exemplo, que um rico comerciante carioca, chamado Elias Antônio Lopes ofertou ao monarca a Quinta da Boa Vista, livrando a família real de viver nas condições em que se encontravam no paço do Vice-Rei, indigna da condição deles. Assim o fizeram para se aproximarem do poder. Nasceu aí nosso clientelismo?

Casas receberam a inscrição de pertencimento ao Príncipe Regente (P.R.)

É sabido também que para abrigar os milhares de nobres e cortesãos que acompanharam a comitiva real, cerca de duas mil casas foram requisitadas, tendo seus moradores desalojados. Ao receber o selo de P. R. (Príncipe Regente) o carioca, com seu nascente humor logo entendeu o recado: Ponha-se na Rua!

É fato que ao receber a família real com tantas honras, os brasileiros, especialmente aquela elite que por aqui se formava mirava outras coisas —  seus próprios interesses.

Com vistas a isso, a imagem de uma corte endeusada foi difundida. Para a pequena burguesia que viva na capital da colônia surgia uma oportunidade rara de pertencer a uma corte. Para a população empobrecida, vendeu-se uma imagem de profunda superioridade: a dos nobres em relação a eles, pobres mortais.

Os pontos positivos que podemos citar dos primeiros dias em que D. João permaneceu em Salvador, antes de desembarcar no Rio de Janeiro dizem muito sobre isso. Isto é, até o que foi positivo para o Brasil, como a abertura dos portos para as ”nações amigas” (diga-se, Inglaterra)  tem mais a ver com o acordo que ele costurou com os ingleses para ser transportado em segurança para as Américas e com as necessidades que ele passaria a ter por aqui do que com benesses à Colônia do que com a atenção que ele devia ao povo da colônia. Esta já clamava por isso há tempos e isso era-lhe reiteradamente negado.

Assim, o momento da vinda da família real, no lugar de se tornar um momento propício para Portugal construir nas Américas um estado bem planejado constituiu-se, ao contrário, o ápice da desorganização e da improvisação.

José Bonifácio e Elias Antônio Lopes

José Bonifácio de Andrada e Silva é tido como o patrono da Independência. Mas, antes de influenciar direta e decididamente no processo de separação política do Brasil de Portugal, Bonifácio esteve no continente europeu onde, inclusive, ajudou a defender Portugal da invasão napoleônica. Sim, apesar de ser brasileiro,  nascido na cidade de Santos, José Bonifácio não embarcou junto com a Corte portuguesa para o Brasil naquele momento extremo.

Elias Antônio Lopes foi um rico e poderoso traficante de escravos. Nascido, provavelmente, na cidade do Porto, por volta de 1756, emigrou para o Brasil em 1771, já iniciado no comércio de grosso trato – importação e exportação.

Do comércio de tecidos e utensílio, avançou naturalmente para o comércio de escravos. Enriqueceu-se consideravelmente entre as décadas de 1780 e 1790. Enquanto a revolução que iria levar Napoleão a invadir Portugal e a transferir a Corte para a América, Elias Antônio firmava-se como um dos mais ricos negociantes do Vice-Reino do Brasil.

“Quinta da Boa Vista” é marca do clientelismo no país.

Nesse momento, Bonifácio, como conselheiro real em Portugal traçava planos e o apresentava ao monarca, a fim de transferir a Corte para o Brasil —  de início, uma ideia estapafúrdia.

Mas, como a história iria confirmar, em 1807 a Corte foi obrigada a se transferir para além mar. Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, Lopes presenteou o príncipe Dom João com um palácio, a futura Quinta da Boa Vista, que se tornou morada oficial do monarca.

Depois, se envolveu na captação fiscal, uma das atividades mais lucrativas da colônia. Foi nomeado corretor e provedor da Casa de Seguros da Corte. Também foi deputado.

Elias Antônio Lopes faleceu em 1815, aos 59 anos de idade. Não deixou testamento, e nem teve filhos. A sua riqueza gerou uma grande briga entre seus herdeiros: seus irmãos e seus sobrinhos. Seu empreendimento continuou funcionando até 1816, realizando mais quatro expedições.

Bonifácio retornaria de sua estada na Europa em 1819. Já contava com 56 anos, uma idade um pouco avançada para os padrões da época. Mas seu grande trabalho estava por começar.

Agora, ele desempenharia um papel crucial em ajudar D. Pedro I a promover e alcançar a independência do Brasil em relação a Portugal. Atuou como um dos principais defensores da independência e foi fundamental na formação do governo inicial da nação recém-independente.

Ao participar da Assembleia que iria realizar a primeira Constituição da nova Nação tentou torna-la liberal para além das expectativas do monarca. Caiu em desgraças diante do soberano ao criticar ao próprio D. Pedro I o caso extraconjugal que o mesmo mantinha com Domitila de Castro, conhecida como a Marquesa de Santos. Essa relação era amplamente conhecida e mal vista por parte da sociedade e da elite brasileira da época, que esperava um comportamento mais adequado do monarca.

Bonifácio, conhecido por sua postura moralista e defensora dos princípios monárquicos, via a situação como prejudicial ao país.

No entanto, Dom Pedro I não gostou das críticas de José Bonifácio e o acusou de conspirar contra o seu governo. Essas tensões culminaram na demissão de Bonifácio de seu cargo de Ministro do Império em 1823. O afastamento de José Bonifácio enfraqueceu o governo imperial e contribuiu para a instabilidade política que marcou os primeiros anos do Império do Brasil.

Mais tarde, de volta do exilio, Bonifácio ainda seria o tutor de D. Pedro II. Ao partir para Portugal, a fim de controlar a Revolução do Porto que lá se desenvolvia, D. Pedro I sabia que não existia ninguém melhor do que o antigo conselheiro para educar o menino que deixava como príncipe regente no Brasil.

Porém, logo Bonifácio seria destituído desse cargo. Os regentes e outros políticos temiam a autoridade e o poder de Bonifácio sobre o jovem imperador, preocupando-se com a centralização do poder. Além disso, havia desentendimentos em relação a políticas e reformas que Bonifácio defendia.

Após sua destituição, José Bonifácio se retirou da vida política e passou o restante de sua vida em relativo isolamento. Sua saída da cena política marcou o fim de sua influência direta sobre o governo e a educação de Dom Pedro II. No entanto, ele permaneceu uma figura importante na história do Brasil, devido ao seu papel na independência e nos primeiros anos do Império.

Faleceu em Niterói, Rio de Janeiro, no dia 6 de abril de 1838. Ele tinha 80 anos de idade na época de sua morte. A morte de José Bonifácio marcou o fim de uma era na política brasileira e uma das figuras mais proeminentes dos primeiros anos do Império do Brasil. Faltavam dois anos para a ocorrência do Golpe da Maioridade, que elevou o príncipe regente à Monarca com apenas 14 anos de idade.

Contexto: As Guerras Napoleônicas

A revolução Francesa gerou Napoleão Bonaparte que gerou a libertação da América europeia. Nada disso foi programado. Uma coisa foi consequência da outra. Ao aplicar o bloqueio continental, Napoleão estava fazendo transferir a corte portuguesa para o Brasil e provocando a liberdade política do gigante sul americano. Portugal novamente se viu relegado a ser um pequeno reino e agora seria a Inglaterra quem sequestraria as riquezas do Brasil.

França visava enfraquecer seu rival europeu financiando a independência dos EUA.

O Brasil nasceu herdando as dívidas de Portugal. Diferentemente do que aconteceu quando da independência dos Estados Unidos, pela qual a França patrocinou a guerra que retiraria o gigante norte americano das mãos de sua rival, Inglaterra, por aqui se deu exatamente o contrário. Por aqui foi a Inglaterra que transferiu a dívida que Portugal havia contraído junto aos ingleses para a nascente nação sul americana.

Curioso observar também que durante o período Portugal será, de certa maneira, administrado por ingleses. Foi o exército inglês que se uniu ao povo que ficara no país para combater a invasão napoleônica. O comando do exército português, que era a única força real do país foi entregue aos ingleses. Essa situação irá perdurar até 1814.

De uma assistência militar a situação iria se ampliar para a influência política. É nesse contexto que se pode compreender a Revolução do Porto. As consequências desta Revolução será a ida de D. Pedro I para Portugal, onde assumirá o nome de D. Pedro IV de Portugal.

Por aqui, quem ficará como príncipe regente será uma criança de cinco anos de idade. O poder será compartilhado por uma regência, a princípio trina —  aliás, um período tumultuadíssimo da política nacional brasileira.

Poderíamos dizer que tudo isso se deu em consequência das invasões que Napoleão promovia na Europa de então? Parece que sim.

Se no primeiro momento de nossa história foi a economia que ditou os destinos, agora foi a política. A política expansionista de Bonaparte, mais do que a questão econômica será a responsável pela vinda da família real para o Brasil, da consequente transferência da Coroa para cá, da Revolução do Porto tão logo o perigo da guerra se arrefeceu na Europa, da ida de D. Pedro I para lá, da implantação do sistema das regências no Brasil.

Consequências: conflito entre poderes, complexo de inferioridade e clientelismo

O período de nascimento do Brasil como nação independente é significativo em termos das características que imprimiu na própria alma da Nação.

A primeira consequência é que, politicamente, o país surgiu instável. Quando a corte foi transferida para o Rio de Janeiro, um projeto que já vinha se desenvolvendo desde que Portugal tentou implementar um governo central, para controlar o domínio dos donatários em suas respectivas regiões foi reativado. Isto remonta a 1549!

Ou seja, desde o início o governo de Portugal fazia esforços para concentrar o governo da colônia em um único lugar. Porém, dado às dimensões continentais do Brasil, isso se tronava inviável. O sistema de capitanias deu muito poder aos donatários (os responsáveis pelas capitanias), que frequentemente agiam de maneira autônoma e fora do controle direto da Coroa Portuguesa. Isso dificultava a implementação de uma política colonial coesa e eficaz.

Portanto, agora, já no alvorecer no século XIX era a própria Coroa que para cá migrava. A força de um governo central se tornava, assim, irresistível. Mas nem por isso os ‘regionalismo’ perderam força.

A chegada da família real ao Brasil e a subsequente centralização do poder geraram várias revoltas locais. Esses movimentos foram motivados por insatisfações econômicas, políticas e sociais, e refletiram a resistência das elites locais à perda de autonomia. Embora muitas dessas revoltas tenham sido suprimidas, elas pavimentaram o caminho para a crescente demanda por independência e autonomia, culminando na independência do Brasil em 1822. Mas, mesmo com a Independência, a política nacional se acalmou, pelo contrário!

Ainda hoje o embate entre poder local e poder central se faz sentir. Inclusive governos autoritários e militares muitas vezes trazem exatamente esta característica —  diminuir o poder de governos regionais. Centralismo contra regionalismo é característica de nossa política que perisiste ainda hoje. Uma questão ainda mal resolvida.

Brasileiro valoriza produto importado em detrimento do nacional.

Outra característica sugida naquele momento de nossa história é a tendência que o brasileiro tem de achar que as coisas importadas são melhores do que as coisas nacionais.

O marco fundante está no próprio descobrimento, quando os índios se maravilharam com as bugigangas dadas pelos portugueses que pretendiam trocar ouro por pequenos espelhos.

Mas o momento marcante disto foi o da vinda da família real para o Brasil. Vieram como nobres que se prestaram a viver entre os pobres. Os pobres abriram-lhes as portas de suas casas e os seus corações. Os nobres apenas impuseram sua condição superior. Mal sabiam os nativos que a riqueza que alimentaria as cortes europeias por um longo período, financiando inclusive a revolução industrial inglesa saía (e continua saindo) daqui.

Por fim, outro ponto deste momento que precisa ser destacado é o surgimento do clientelismo entre nós.

O clientelismo é uma prática política arraigada no Brasil, caracterizada pela troca de favores entre políticos e cidadãos, onde os primeiros oferecem benefícios em troca de apoio político. Esta prática tem profundas raízes históricas e continua a influenciar a vida pública no Brasil de várias formas.

O clientelismo no Brasil tem suas raízes no período colonial e no sistema de capitanias hereditárias, onde grandes proprietários de terras (os donatários) exerciam controle sobre vastas regiões e suas populações. Essa prática se perpetuou ao longo dos séculos, adaptando-se às mudanças políticas e sociais.

Porém, a prática se tornou mais visível e eficaz quando da vinda da família real portuguesa para cá. Agora se podia negociar diretamente com os verdadeiros donos do poder. O exemplo de Elias Antônio Lopes é marcante.

Quando a família real portuguesa chegou ao Brasil em 1808, liderada pelo príncipe regente Dom João VI, houve um impacto significativo nas estruturas sociais, políticas e econômicas da colônia. Esse período viu a expansão do clientelismo como um mecanismo importante para a manutenção do poder e a administração da vasta colônia.

A abertura dos portos brasileiros às nações amigas em 1808, seguida pela assinatura de tratados de comércio, favoreceu diretamente comerciantes que apoiavam o governo. Esses acordos comerciais, embora benéficos para o desenvolvimento econômico, também serviram como uma forma de clientelismo, beneficiando diretamente aqueles próximos à corte.

É no Parlamento que o clientelismo e o embate entre poder local/central se mostra mais evidente.

A criação de novas instituições e cargos administrativos, como tribunais, ministérios e instituições educacionais, foi uma maneira de recompensar aliados e consolidar o poder. A distribuição desses cargos muitas vezes se baseava em lealdades pessoais e políticas, em vez de méritos.

A distribuição de terras e concessões agrícolas para nobres e aliados políticos foi outra forma de clientelismo. Essa prática garantiu que a elite agrária permanecesse leal ao regime, ao mesmo tempo em que fortalecia a base de poder local.

A chegada da família real portuguesa ao Brasil em 1808 intensificou as práticas clientelistas, que se tornaram uma ferramenta crucial para a manutenção do poder e a administração da colônia.

Essas práticas, enquanto consolidavam o apoio das elites locais e centralizavam o poder, também perpetuaram a desigualdade social e fortaleceram as bases de um sistema político dependente de relações pessoais e favores, cujas repercussões se sentem até hoje na política brasileira.

No inventário de nossas mazelas, o período é prodigo em criatividade. O país precisa vencer estas barreias para desenvolver-se plenamente. O desafio de enfrentar estas situações permanece.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Menos partidos, mais tranparência

Aécio Neves comanda um dos grupos que disputam poder dentro do PSDB.

Passados os horrores de uma ditadura militar, o que se queria era liberdade partidária. O fato é que a Constituição de 1988 foi bastante liberal no que diz respeito à criação de partidos políticos. O resultado foi a criação de legendas partidárias que nada tinham de ideologia, mas expert em negociatas.

Com o tempo, a lei eleitoral vem conseguindo impor um freio, tanto à criação de novas legendas, quanto à existência e manutenção das mesmas. Se não dá para cassar legendas, que se limite-as em conformidade com sua viabilidade.

Daí o surgimento da cláusula de desempenho que, a cada eleição, vai se tornando mais apertada. Em 2022 somente doze partidos cumpriram as exigências para se manterem com os benefícios do fundão eleitoral e com a propaganda eleitoral gratuita em rádio e TV.

Para 2026 somente participará destas benesses os partidos ou federações que obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 2,5% (dois e meio por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 1,5% (um e meio por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou tiverem elegido pelo menos treze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.

Isso tem forçado os partidos a se unirem em Federações Partidárias, quando não em fusões partidárias, o que necessariamente diminui o número de agremiações.

Por outro lado, estudo realizado pelo jornal Folha de S. Paulo (28.mai) aponta que apenas sete partidos dominam tanto o Congresso quanto a disputa por prefeituras nas eleições deste ano, o que tem sido chamado de G7 pela mídia especializada.

Pela direita, temos o PL, pela esquerda a federação (PT/PCdoB e PV) e, ao centro (ainda que muitos ligados ao centrão, isto é, sem definição ideológica) temos MDB, PSD, PP, União Brasil e Republicanos. O PSDB/Cidadania continua sua agonia política, sangrando a olhos vistos diante de suas disputas internas por poder.

O mais importante é que o ambiente vai se tornando mais claro ao eleitor. Um Partido político deve ser por ele conhecido. Quanto menos partidos (desde que não seja um ou dois) melhor. Parece que estamos chegando a um número ótimo que, pelas dimensões e característica, de nosso país, estudiosos do tema estimam entre sete e doze. 

Apenas devemos cuidar para que leis futuras não venham a tumultuar novamente o ambiente. Tem muita gente interessada nisso porque, é no meio da bagunça que eles fazem a festa.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Moro fica

Moro teve o apoio do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD).

O que se esperar quando PL e PT se unem por uma causa comum? Um ataque à democracia — ao menos ao que se possa esperar de uma democracia evoluída e plena. 

Mas, cada uma destas vertentes do nosso espectro político prefere enxergar democracia com suas próprias lentes. No caso, tentaram retirar o mandato do Senador Sérgio Moro (União) por pura vingança. Se inspiraram na ação que expulsou de Brasília o então Deputado Federal Deltan Dallagnol (Novo), mesmo o ex-procurador tendo sido o deputado mais votado no estado do Paraná.

Porém, desta vez o intentado não foi adiante. Moro se safou da cassação por unanimidade no TSE e finalmente pode sentar-se em paz na cadeira a ele conferida por quase dois milhões de paranaenses. É a vontade das urnas que se impôs.

Os atos antidemocráticos acontecidos em 8 de janeiro de 2023 também visavam retirar das urnas a sua efetividade para fazer valer a vontade de uma minoria estridente. O brasileiro precisa se acostumar com a alternância do poder porque é esse um dos pilares de uma democracia sadia.

Aliás, uma democracia sadia também clama por um Judiciário à altura. As decisões monocráticas emitidas por ministros do Supremo têm causando estragos profundos na estabilidade da política nacional.

Quando a forma se sobrepõe ao conteúdo, o resultado que se alcançará será, na melhor das opções, estético. Dias Toffoli acabou de emitir decisão em que beneficia Marcelo Odebrecht e José Dirceu (PT) baseando sua decisão no fato de as condenações não terem seguido “normas constitucionais”. Mas, agindo assim, passa uma borracha no que foi escrito a tinta. Houveram confissões, delações e provas inequívocas, inclusive devolução de numerários. 

De se lembrar que naquele momento, sem a sintonia entre os órgãos estatais, seria impossível alcançar as figuras que foram alcançadas até porque estas figuras são unidas o bastante para derrubar qualquer ameaça a seus privilégios. Se houve ‘conluio’ entre as autoridades, ela já estava subentendida desde então, ao menos nas entrelinhas. Pensar que nossos supremos não suspeitassem disto é colocar em dúvida a inteligência deles.

Se é a Constituição que impede a Justiça de trabalhar da forma mais ampla possível quando o assunto é combater a corrupção, é porque as leis já foram concebidas para isso mesmo: quando convir, anular processos.

Mas a frase dita por José Dirceu é a chave para melhorar esta situação. Para ele, voltar à Câmara dos Deputados é uma “questão de justiça”. Porém ele mesmo afirma que esta decisão cabe ao povo de São Paulo.

Sim, basta o povo dizer não. Apesar de entender que as urnas sempre devem vencer, devemos também entender que precisamos aprender a votar melhor. Do contrário, estaremos fadados ao descaso de nossas autoridades. Eles têm a certeza de que sabem como nos enganar. Cabe ao eleitor decepcioná-los.

FORMAÇÃO POLÍTICA

Não temos governo

Em Pernambuco, quatro barragens estaduais para contenção de enchentes estão com obras paradas por falta de recursos federais.

A polarização das discussões a respeito da responsabilidade pela tragédia climática que se abateu sobre o Rio Grande do Sul apenas reforça o entendimento de que precisamos superar este cataclisma político.

Governos são passageiros e a alternância no direcionamento deles é saudável. Políticas de Estado devem ser colocadas nas agendas em detrimento das políticas de governo. Fazemos o exato oposto.

Olhando para frente, sabemos que temos muito a fazer para enfrentar de maneira eficiente as mudanças climáticas anunciadas há tempos. Mas basta olhar para trás para constatar que os governos que passam pelo Planalto —   sejam de esquerda ou de direita —   não se preocupam com isso, senão com os imediatismos e com ataques diretos e inúteis à corrente ideológica adversária. Como eleitores, não deveríamos participar deste jogo imoral e improdutivo.

A maneira como nossos governantes tratam do assunto “planejamento”  é ridícula. Levantamento promovido pelo jornal O Globo (13.mai, p. 4) dá conta de que “obras contra enchentes se arrastam até 15 anos, em pelo menos seis estados, com promessas de gastos de R$ 7,3 bilhões (valores corrigidos).”  

Ora, o governo Lula fala em alívio de R$11 bi ao RS. Isto é: fazer algo planejado custa muito menos do que socorrer depois (inclusive e especialmente vidas) mas, parece que respostas dadas às pressas, no desespero das situações são uma marca de nossos (des)governos. Daí concluir que nossos governos não governam, apenas se apegam ao poder para direcionar o país em conformidade com suas inquietações ideológicas. Governar é planejar!

Mais uma vez: precisamos nos aferrar a políticas de Estado, não de governo. A população deve se  prevenir dos discursos divisionistas que as redes sociais promovem, destilando o ódio e não oferecendo nada em troca, que não confusão e desinformação.

A responsabilidade pela tragédia no Rio Grande do Sul é de todos nós, quando assistimos passivos uma sucessão de governantes que não são afetos a planejar, mas sim em distribuir verbas e cargos a partidos que mais se assemelham a organizações criminosas. Eles, em absoluto, não representam os interesses do cidadão.

Somos todos corresponsáveis por mais este triste desastre. Outros virão.